Lei das Sementes Aprovada Pela Comunidade Europeia Oferece Porta Aberta para á Monsanto


Publicado há 10 anos, 3 meses

Do Portugal Mundial
Está agora nas mãos do Parlamento Europeu travar ou não esta calamidade contra a biodiversidade e a liberdade de uso de algo tão natural como as sementes. Face às barreiras impostas por alguns países europeus aos avanços da Monsanto e similares, este é o contra-ataque indirecto e parece que é já uma vitória… mas que futuro andamos nós a criar?
A Comissão Europeia hoje publicou a última versão oficial da proposta para Lei das sementes, juntamente com um comunicado que celebra a “simplificação e ao mesmo tempo reforço” da legislação europeia em matéria de alimentação. A proposta foi aprovada pelos Comissários e segue para o Parlamento Europeu.
O protesto da sociedade civil e de organizações e indivíduos dedicados à preservação de sementes tradicionais e locais, foi parcialmente ouvido, tendo sido criadas derrogações para “operadores não-profissionais” e operadores que tenham menos de 10 empregados e vendas inferiores a 2 milhões de Euros. Estes não precisam de registar as variedades que oferecem, podendo colocá-las no mercado como “material de mercado nicho” (niche market material). Terão também acesso a taxas de registo anuais mais baixas caso queiram registar as suas variedades. Mas nesse caso, passam a ter que obedecer aos critérios de “manutenção da variedade”, o que cria uma barreira burocrática.
No entanto, todos os agricultores ou organizações de preservação de sementes com mais de 10 empregados, continuam a ter que registar todas as variedades que oferecem, e serão sujeitos a taxas de registo anuais e processos administrativos complexos. Não poderão trocar sementes, mesmo a título gratuito. Uma vez que o Regulamento se aplica, para além da disponibilização de sementes, à sua produção, efectivamente a prática de guardar sementes e resemeá-las (sem serem registadas) será banida para os operadores com obrigação de registar as suas variedades de sementes.
O termo operador é lato e engloba todas as pessoas ou entidades que praticam profissionalmente seja a preservação, produção e/ou venda de sementes, inclusive a oferta de serviços relacionados com a produção de sementes.
Todos estes operadores terão de se inscrever e ficam sujeitos a uma longa lista de obrigações, entre elas a manutenção de um registo de todas as entidades e pessoas de quem recebem sementes e a quem cedem sementes. Aqui a isenção para pequenos operadores não se aplica!
Mantém-se a impossibilidade de registar variedades de sementes tradicionais que não estavam comprovadamente no mercado antes da entrada em vigor da nova lei, o que exclui à partida todas as variedades que possam resultar de futura selecção e adaptação de variedades tradicionais existentes. Adicionalmente, as variedades tradicionais registadas passam a estar associadas a uma “região de origem” e apenas poderão ser produzidas nesta região.
Finalmente, a Comissão Europeia adquire poderes especiais para regular o mercado das sementes. Transforma-se na única autoridade que controla a implementação da nova Lei. Será ela a decidir quais as espécies que podem ser autorizadas, proíbidas, as excepções que se podem aplicar ou não, e a decidir todos os detalhes, agora e no futuro, para fazer cumprir a nova Lei. Ela poderá delegar parte destes poderes na CPVO (Community Plant Variety Office, que passará a chamar-se Agência Europeia das Variedades de Plantas), que se sobrepõe assim às autoridades nacionais em tudo o que diz respeito a sementes, outro material de propagação de plantas e as variedades de plantas.
Esta última proposta, apesar das derrogações conquistadas, continua a ameaçar a agro-biodiversidade e a segurança alimentar local, pela complexidade dos processos a que obriga (inscrição como operador, rotulagem, registo de todos os passos de preservação e produção de sementes, exigências de rastreabilidade, obtenção de uma “Descrição Oficialmente Reconhecida” para sementes tradicionais, etc) e pelo facto de colocar limites às mesmas derrogações (apenas para certos operadores, apenas para variedades tradicionais que estavam no mercado quando a Lei entrar em vigor e tudo sempre sujeito à deliberação da Comissão Europeia). O Regulamento deixa muito espaço para futuras deliberações da Comissão Europeia, que facilmente poderá abolir derrogações ou colocar novos limites.
A nova Lei das Sementes vai regular muito mais do que seria necessário para garantir uma oferta saudável e diversa de sementes no mercado, vai criar barreiras inultrapassáveis para muitas pessoas e entidades envolvidas na preservação de sementes, vai reduzir a escolha dos agricultores, horticultores e consumidores e abre caminho para um controlo absoluto sobre a circulação de sementes pela Comissão Europeia e a Agência Europeia responsável para o registo e controlo de variedades. A sociedade civil continua por isso a rejeitar esta Lei e a pedir para excluir do seu âmbito, as variedades de sementes de polinização aberta e sementes sobre as quais não recaiam direitos de propriedade intelectual, assim como as sementes obtidas das suas próprias colheitas por agricultores e guardiões de sementes.

Fonte: Campanha Europeia pelas Sementes Livres

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