Diversidade do Semiárido Brasileiro marca painel sobre a resistência dos povos e dos territórios

A Plenária do segundo dia do EnconASA (22) abordou o tema do evento: Povos e Territórios: resistindo e transformando o Semiárido. Confiram.


A Plenária do segundo dia do EnconASA (22) abordou o tema do evento: Povos e Territórios: resistindo e transformando o Semiárido. Confiram.


Publicado há 8 anos

Povos e Territórios: Resistindo e Transformando o Semiárido. Foi com este tema que o IX EnconASA deu início ao seu segundo dia. No painel, uma diversidade de povos e territórios para contar suas histórias de lutas e resistências. A mesa contou com a presença de Elias Freires, representante da juventude rural de Pernambuco; Maria Rosalina dos Santos, representando comunidades quilombolas do Piauí; Ivaneide Maria Souza Santos, liderança na comunidade índigena Xakriabá, do norte de Minas Gerais; Ivone Brilhante, do movimento de mulheres da Chapada do Apodi; Lourdes Vicente, do Movimento dos Sem Terra; além do Professor Dr. Roberto Marinho, do Rio Grande do Norte que levantou reflexões sobre o movimento de lutas, resistências e transformações do Semiárido.

O jovem pernambucano, Elias Freires, iniciou as falas ressaltando a ocupação das escolas como exemplo de empoderamento dos jovens. Ele apontou ainda, a importância das organizações da sociedade civil na formação dos jovens, que passam a participar de espaços políticos com uma visão mais crítica dos processos de luta. “O jovem não é o futuro. É o presente e o futuro da nação. O jovem pode ser liderança, um vereador, um prefeito, hoje, e não esperar apenas pelo amanhã. Temos que trabalhar a juventude no presente. As organizações da ASA estão transformando o Semiárido. Hoje sou uma liderança graças a essas formações políticas. Juventude que ousa lutar, constrói o poder popular”, conclui Elias, convidando todos a um grito de ordem.

Rosalina dos Santos, representante do povo quilombola do Piauí, segue no painel levantando questões desafiantes para o povo negro e quilombola. “Desde o processo de colonização do Brasil os negros vieram e passaram por processos difíceis. Fomos obrigados a falar a língua dos outros, a plantar sementes dos outros, a aprender a religião dos outros, mas resistir aos desafios impostos, ao longo da história. Não conseguiram tirar nossa autoestima e nossas energias. Nossas organizações foram suficientes para resistir”, revela. No Brasil, segundo Rosalina, são mais de 5 mil comunidades quilombolas, sendo que a maior concentração está no semiárido. As ameaças também são muitas. Rosalina conta que muitas comunidades estão em territórios visados pelas mineradoras e pelos grandes projetos de exploração. Por isso, estão sendo atacadas. “Entendemos que os territórios são a nossa vida, onde desenvolvemos sentimento de pertença, onde nossa vida está enraizada. Território é vida!”, finaliza Rosalina.

A índia Xakriabá, Neide, fala sobre as lutas e resistência do seu povo | Foto: Adriana Noya

Ivaneide Maria Souza Santos, da comunidade indígena Xakriabá, norte de Minas Gerais, contempla os desafios para o seu povo, principalmente, nos conflitos na luta pela terra e território. “A gente não quer tomar terra de ninguém, queremos o que sempre foi nosso por direito, e nos foi tomado. Estávamos às margens do Rio São Francisco e fomos obrigados a sair em nome do desenvolvimento e dos grandes projetos de irrigação. Isso foi mortal, porque mudou nossa relação com o rio”, conta. Ivaneide diz que hoje as crianças não sabem mais nadar porque não têm mais relação com o rio e morrem afogadas. “O rio foi retirado da gente. Tudo o que temos hoje foi com muita luta e muito sangue”. Neide, como se apresenta, diz que o sonho do povo Xakriabá é retomar as terras da margem do Rio São Francisco.

Os conflitos na Chapada do Apodi também foram contemplados no painel por Ivone Brilhante, representantes das mulheres do Apodi. Ela conta que estão o tempo todo em conflito e querem expulsar as famílias dos territórios para acabar com a agricultura familiar. Ivone afirma ainda, que a população local não é vista e nem valorizada porque não produzem para exportar. Produzem para alimentação da família, para a qualidade de vida. “O agronegócio está engolindo nosso país. Quando você produz, você sabe o que esta comendo”, alerta.

Lourdes Vicente, do Movimento Sem Terra, finaliza as falas das resistências lembrando que esses povos do Semiárido são muitos. Ela cita os quilombolas, os ribeirinhos, as marisqueiras, os pescadores, os camponeses, os sem terra, mulheres e homens trabalhadores rurais. Ela diz ainda que a luta precisa de bandeiras para se fortalecer e agregar ações em redes. É a Agroecologia, enquanto projeto político, modo de produção e cultura; feminismo; justiça ambiental, soberania alimentar, defesa das sementes, valorização das pessoas e dos saberes.

Que transformação é essa?

Com essa pergunta, o professor Roberto Marinho inicia suas reflexões a partir das histórias de resistências contadas no painel. Para Marinho, falar de resistência é mais do que falar que o povo resiste às dificuldades causadas pela estiagem. Ou falar que houve diminuição dos êxodos, dos saques e da mortalidade infantil no Semiárido. Falar de resistência é falar de um povo que, além de resistir, está transformando o Semiárido. O professor faz um histórico das políticas voltadas ao desenvolvimento do Semiárido com a concepção de combate à seca e a mudança, como a luta dos movimentos sociais e principalmente da ASA, para a concepção da convivência. Ele aponta ainda, como é importante não perder o sentido da história. De uma história de resistência que tem 300 anos e começa quando os colonizadores adentram o interior do país, com as divisões dos latifúndios entregues aos coronéis.

“Com a criação de gado, a expansão territorial se depara com as terras indígenas gerando conflitos que permanecem até hoje. A resistência desses povos já começa aí. Os colonizadores queriam as melhores áreas, que já estavam ocupadas pelas comunidades indígenas”, conta. Marinho lembra também o cangaço e o messianismo como formas de resistência. “Era o povo pobre e massacrado pelo coronelismo, pela indústria da seca que diminuía a capacidade de resistência”. O professor ressalta ainda que, a partir da criação da ASA, passou-se a construir um projeto político de transformação do Semiárido brasileiro. “Pela primeira vez, no século XXI, conseguimos dar passos para a transformação do Semiárido brasileiro. As mazelas, os conflitos e ameaças do hidro e do agronegócio continuam, mas o movimento também se fortalece nas resistências dos seus povos”, finaliza.


Postado por: Fabiano Cordeiro César

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