Myrlene Pereira
Cáritas Diocesana de Araçuaí
Reconhecido como 6ª economia do mundo, o Brasil vem sendo foco de admiração de muitas pessoas e, ao mesmo tempo, de questionamentos daqueles que se preocupam com o bem comum. Há muito tempo as comunidades do Vale do Jequitinhonha vem sofrendo os efeitos do perverso modelo de desenvolvimento capitalista, que tem predominado na sociedade atual. Para garantir sua base minerária, o sistema econômico em Minas Gerais criou uma estrutura que massacra e suprime a natureza desta região. Ao longo do Rio Jequitinhonha, várias mineradoras vem se instalando afim de retirar os diversos tipos de minério. Para que isso seja possível, o governo vem contribuindo de diversas formas. As empresas, que precisam de energia para o processo exploratório, têm financiado, juntamente com o governo, a implantação de hidrelétricas na região. O projeto prevê que sejam implantadas 14 grandes e 6 pequenas usinas hidrelétricas em toda a extensão do rio Jequitinhonha. Até o momento, 2 já foram instaladas e a construção da terceira, na cidade de Coronel Murta, acaba de ser embargada, segundo fontes da UFMG.
Desde a implantação da hidrelétrica de Irapé, muitas famílias vêm sofrendo com a desapropriação de suas terras, pois os reassentamentos para onde foram encaminhadas não dispõem de água potável, são muito distantes das cidades, estão em terras inférteis ou impróprias para a produção, entre outras dificuldades apontadas por lideranças das associações dos assentados. As comunidades próximas à hidrelétrica de Itapebi também estão muito insatisfeitos com a instalação desta, uma vez que têm percebido a diminuição de peixes e proliferação de doenças, além da danificação de casas por infiltramento e da quase extinção da tradição das lavadeiras do rio, que receberam como “recompensa” uma lavanderia com frágil estrutura, que não compreende as necessidades destas mulheres.
Outra fonte de energia para as mineradoras é o carvão, muitas vezes extraído da produção de eucalipto, que vem tomando territórios pelas terras do Vale. Muitas famílias tiveram suas terras compradas a baixo custo, enchendo as cidades sem estrutura para recebê-las. A monocultura do eucalipto tem diminuído a diversidade da região, ocupado os campos que antes eram considerados “comuns” e usados para a solta do gado. Além disso, as plantações recebem defensivos tóxicos jogados por aviões, preocupando as populações do entorno, pelo alcance que estas nuvens tóxicas podem tomar.
A própria extração de pedras tem deixado suas marcas. Depois de alguns anos de intensa exploração, na cidade de Itinga foram percebidas danificações em casas históricas, o que gerou revolta da população que se articulou e fez com que as empresas que atuam ali não mais passassem com suas cargas por dentro da cidade. Mas o município vem sofrendo com uma degradação silenciosa que, aos poucos, vem à tona. Trata-se das grutas com pinturas rupestres e artesanatos primitivos, engolidas pelas máquinas da mineração, ao invés de se tornarem documentos da história do Vale do Jequitinhonha, que tem registros de povoação de 11.000 anos.
Esta teia que serve para beneficiar apenas algumas empresas, muitas delas estrangeiras, vem sendo denunciada pelas comunidades, cansadas de tanta exploração. A UFMG estuda estes conflitos e já está em avançado processo de construção de um mapa, que servirá para pesquisa e denúncia dos malefícios do sistema perverso do capitalismo.
Aproximando-se a “comemoração da independência do Brasil”, os povos do Vale resolvem gritar para que esta independência também os alcance. Eles clamam pela valorização deste povo, reconhecido mundialmente por sua cultura, mas também mundialmente conhecido por sua pobreza, conseqüência dos longos anos de exploração. Os povos do Vale do Jequitinhonha exigem liberdade!