Sem ter o título de legitimação do terreno de sua casa, ele teme perder o lugar onde vive com a mulher. “Não sei como ficou a nossa situação. A sorte é que eu tenho os documentos (de legitimação) das terras que ficam na roça”, afirma ele, sobre o terreno onde cultiva mandioca e de onde tira o sustento da família.
Isolada entre plantações de eucalipto, a comunidade tem cerca de 300 habitantes, uma escola, um posto de saúde e três mercearias. Lavouras e carvoarias do entorno são os principais empregadores.
A área de Nova Aurora teria sido anexada à de outras oito fazendas em Rio Pardo de Minas para a venda. O MPE apurou que a quadrilha, formada por empresários, intermediários e políticos, teria lucrado R$ 250 milhões comercializando terras do Estado.
As ramificações se estendiam por oito cidades além de Rio Pardo de Minas. Parte do dinheiro pode ter sido enviada para um paraíso fiscal no Uruguai. As fraudes teriam o apoio de servidores do Instituto Estadual de Terras (Iter-MG), órgão ligado à Secretaria de Estado de Regularização Fundiária. O ex-secretário Manoel Costa, exonerado por causa do escândalo, é suspeito de integrar o esquema.
Segundo o MPE, em uma das fraudes, todos os nomes de “laranjas” de um dos terrenos remetiam para um só endereço, que era o mesmo de Breno Rodrigues Mendes, um engenheiro florestal de Taiobeiras que está sendo investigado.
Em um dos casos registrados pelo MPE em Salinas, 11 homens invadiram uma casa para agredir um posseiro e expulsá-lo da terra. O grupo teria sido liderado pelo policial civil Douglas Moisés Quintiliano, que foi preso pela PF.
Os irmãos Marcus Tácito Penalva Costa e Virgílio Tácito Penalva Costa, prefeitos de Indaiabira e Vargem Grande do Rio Pardo de Minas, respectivamente, foram afastados de seus cargos. Os substitutos devem tomar posse até amanhã.
INVESTIGAÇÃO: MP ouviu 30 vítimas do bando - O inquérito que investiga o esquema de grilagem tem centenas de páginas com denúncias, depoimentos transcritos e documentos, além de gravações telefônicas, fotos e mapas. Antes de solicitar as prisões, o Ministério Público Estadual (MPE) já havia ouvido 30 posseiros prejudicados pela quadrilha. A investigação começou no fim de 2010 e não tem data para ser concluída, segundo o promotor Bruno de Oliveira Muller, da comarca de São João do Paraíso.
Ao todo, 18 pessoas entre empresários, servidores públicos e autoridades estão sendo investigadas. Os depoimentos dos nove presos também vão embasar os próximos passos dos promotores. Pelo menos dois dos envolvidos usam o direito da delação premiada. Um deles, ouvido há vários meses pelo MPE, foi quem deu as primeiras pistas sobre o grupo. “Ele decidiu denunciar a grilagem porque o grupo cortou a parte (de dinheiro) que cabia a ele”, explica o promotor.
Os trabalhos do MPE se concentram agora na perícia de computadores e documentos apreendidos pela PF. Cartórios também estão na mira dos investigadores. Prestes a ser concluída, uma auditoria feita pela Controladoria Geral do Estado na Secretaria de Estado de Regularização Fundiária promete trazer à tona detalhes sobre as fraudes ocorridas no órgão, inclusive no Instituto Estadual de Terras (Iter-MG).
Uma das dúvidas é em relação à participação dos “laranjas”. Não se sabe ainda se todos eles tinham consentimento com a ação ou se tiveram seus dados roubados. Há registros das duas situações. No caso do povoado de Nova Aurora, em Rio Pardo de Minas, a negociação teria sido feita sem o conhecimento dos posseiros.
O promotor sabe que está indo contra os interesses de pessoas e empresas poderosas. “Não tenho medo. Minha satisfação é ver que os fatos estão sendo esclarecidos”, afirma Bruno Muller, que tem 31 anos, é natural de Belo Horizonte e atua na região desde outubro do ano passado.(JT)
Fraudes ocorrem há décadas e impunidade é generalizada
A grilagem de terras no Norte de Minas acontece há pelo menos quatro décadas. Uma fonte ligada ao Sindicato Rural de Salinas diz que as fraudes são habituais. “Muitas pessoas desrespeitam a lei e continuam impunes”, conta o homem, que pediu para não ter o nome divulgado.
O presidente do mesmo sindicato, Mário Francisco dos Santos, coleciona casos de brigas entre vizinhos e até mesmo entre parentes pela posse ou divisão de terras. A entidade é procurada quase todas as semanas para mediar conflitos.
A exploração de minério na região acirrou os interesses por territórios. Para a Polícia Federal, a “corrida do minério de ferro” coloca o Norte de Minas na rota de pessoas interessadas em praticar “atividades especulativo-criminosas”. (JT)
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