QUILOMBO DA LAPINHA EM MINAS É FORÇA E VITÓRIA


Publicado há 10 anos, 5 meses

Por Priscila Souza de Carvalho - Comunicadora Popular da Cáritas Regional Minas Gerais e ASA/MG 

 


Foto: Priscila Carvalho
JOSÉ TEODORICO Borges, conhecido como Doriquim e Dermira Ferreira Borges, conhecida como Deca, estão casados há 27 anos, vivem no Quilombo da Lapinha. Possuem quatro filhos Nilson, Nilton, Nelma, Noemia e cinco netos, Luidy, Davi, Emily e Ana Julia, está última mora com eles.

O Quilombo da Lapinha, situado no município de Matias Cardoso, norte de Minas Gerais, é constituído por cerca de cento e sessenta famílias e, é composto pelas comunidades Varzea da Manga, Lapinha, Saco, acampamento Rio São Francisco e Ilha da Ressaca. Esta comunidade quilombola ocupa o seu território, desde o século XVII. Deca e Doriquim explicam que Matias Cardoso era ponto de comercio e troca de mercadorias, e com seus senhores haviam sempre os escravos. A vila que virou cidade é mais velha do que Mariana e Outro Preto. Vários de seus ancestrais se rebelaram e fugiram formando os quilombos, principalmente vindos das fazendas da Bahia, e adentraram a chamada Mata da Jaíba, nos vales do Rio São Francisco, Verde Grande e Gorutuba.

Deca e Doriquim, como várias outras famílias quilombolas, viviam cercados por fazendeiros que se apropriaram das terras da região por volta de 1970. No período das grandes cheias a ilha inunda, e eles têm que procurar jeito de sobreviver na cidade. Quando mudaram para a ilha conheceram Jezuíto Gonçalves, que vive na comunidade próxima chamada Lapinha. Segundo o casal, Jezuíto descobre em seu envolvimento com movimentos dos povos tradicionais que território é um direito garantido por lei para descendentes e remanescentes de comunidades quilombolas. Para garantir este direito recorreram ao apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ao Centro de Agricultura Alternativa (CAA) do antropólogo João Batista. E o ITER (Instituto de Terras) e a Unimontes (Universidade Estadual de Montes Claros) disponibilizaram serviços de laudos, advogados, e ajuda nas viagens e mobilizações do quilombo.

Foto: Priscila Carvalho
Este esforço deu resultado, pois em 2005 conseguiram provar na justiça que são os membros das antigas famílias quilombolas. Contudo, o reconhecimento de que eles têm um território foi outra luta. Para isso, criaram a Associação do Quilombo da Lapinha, cujo atual presidente é Doriquim. E em 2006 retomam por si próprios o território em que viveram seus antepassados e do qual foram expulsos com a chegada dos fazendeiros.  Eles contam que a terra em disputa, encontra-se há mais de vinte anos abandonada e é, portanto improdutiva, sendo ocupada apenas por caseiros que recebem para vigiar a propriedade.

Por isso, montaram o acampamento denominado de Rio São Francisco. A partir daí iniciou-se um processo de negociação entre os quilombolas, fazendeiro, INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e juiz. Depois de o caso ser disputado em várias instâncias, contabilizando, sete anos de luta, conquistaram o decreto de direito ao território e que provisoriamente tem posse de 22 hectares para permanência das famílias até que o INCRA realize a demarcação de todo o território.

Agora estão aguardando a demarcação, para concretizar a conquista da terra. No entanto, eles dizem que esta conquista não foi simples assim, pois desde que realizaram a retomada do território os policiais constantemente os visitavam armados para amedrontá-los. Deca, de forma convicta nos afirmou, “Aprendemos muito dos nossos direitos no intuito de defender nossas vidas. Aprendemos a mobilizar advogados, secretários, Ministério Público (MP). A gente não sabe como agradecer a Deus por ter passado vivo por todos estes conflitos com os policias armados, falsos oficiais de justiça ameaçando para assinar documentos”, diz Deca.

Os remanescentes das comunidades quilombolas destacam que a comunidade sempre unida para mutirões e trabalhos coletivos em todas as ações os levou a conquistar não só direito a terra, como também professoras e enfermeiras da própria comunidade melhorando o atendimento da saúde e educação, projetos de acesso à água para beber com as cisternas de placa de cimento e uma horta PAIS (produção agroecológica integrada e sustentável) através do CAA e CPT; criação de galinhas; padaria, fabriqueta de rapadura do Programa de Combate à Fome. E ainda, a contribuição de seu Francisco aposentado da Petrobras que conseguiu um sistema de tratamento de água para o assentamento São Francisco.

Deca e Doriquim finalizam dizendo da resistência e da persistência coletiva que tiveram para conseguir seus direitos tendo de enfrentar, polícia e o poder público de Matias Cardoso, Montes Claros e Brasília. “Já fechamos o INCRA por três dias, ficamos mais de 2 semanas em Brasília. O povo pergunta como conseguimos nossas terras tão rápido, mas a questão é que nunca paramos, esta luta é assim não para”, nos declarou Doriquim.

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