Entre os dias 21 e 22 de maio, aconteceu em Porteirinha, Encontro da Rede Estadual de Guardiões e Guardiãs da Agrobiodiversidade do Semiárido Mineiro, reunindo o Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha em um espaço de troca de saberes, de experiências, socialização de atividades e construção de estratégias. Participaram representantes das casas de sementes do Programa Sementes do Semiárido, representantes das casas de sementes do Programa P1+2, guardiões e guardiãs de sementes crioulas e técnicos e técnicas das organizações que constroem a Articulação Semiárido Mineiro.
Por Lívia Bacelete, comunicadora popular da ASA Minas
Com música e animação, os moradores do Assentamento Tapera, no município de Riacho dos Machados, receberam um grupo de participantes do Encontro da Rede Estadual de Guardiãs e Guardiões da Agrobiodiversidade do Semiárido Mineiro, no dia 21 de maio. A visita integrou a programação do encontro, que reuniu guardiões de sementes crioulas e técnicos das organizações que compõem a Articulação no Semiárido Mineiro (ASA Minas), nos dias 21 e 22 de maio, em Porteirinha.
“Essa terra é nossa vida, nessa terra nós nascemos. Com a fé em Jesus Cristo, temos certeza que venceremos”. O verso cantado pelos moradores do assentamento durante a visita é um trecho da música composta por Oscarino Aguiar Cordeiro, agricultor, poeta e diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Porteirinha. Oscarino, que também estava na visita, contou que a música foi escrita na época da luta pela terra na Tapera.
O agricultor Antônio Pereira dos Santos era agregado na fazenda Nossa Senhora das Oliveiras, nome da fazenda onde hoje está localizado o assentamento. Ele conta que, na época, 56 famílias viviam como agregadas nas terras do Sr. Alcebino, conhecido na região como Major. “A gente falava que era agregado para não falar que era escravo. Para a gente fazer uma roça, tinha que implorar para ele primeiro”, lembra.
Antônio, que hoje integra a Associação Comunitária do Assentamento Tapera, recorda que no dia 6 de novembro de 1986, o Incra fez o pedido de desapropriação das terras para a reforma agrária. A fazenda tinha uma área de 20.482 hectares e foi vendida para duas reflorestadoras de eucalipto, no dia 4 de maio de 1990.
“Procuramos a CPT [Comissão Pastoral da Terra] e o Sindicato de Porteirinha”, conta Antônio. Ele lembra que as famílias se organizavam em grupos para barrar a entrada da empresa, muitos receberam ameaças de morte e arriscaram a própria vida. Dona Ana da Conceição dos Santos foi uma dessas. Ela conta que as pessoas da região recomendavam que eles não mexessem com o fazendeiro, “ele tem dinheiro e vai por vocês na cadeia”, avisavam, ao que ela respondia: “ele tem dinheiro e nós temos Deus”.
As famílias organizadas, com o apoio das entidades e sindicatos que atuavam na região, denunciaram para o IEF (Instituto Estadual de Florestas) o desmatamento ilegal realizado pelas empresas reflorestadoras para o monocultivo de eucalipto. A partir da denúncia, o IEF interrompeu as atividades das reflorestadoras e procurou as famílias para destinar as terras para a reforma agrária. Em novembro de 1993, foi assinada a desapropriação de 4 mil hectares de terras, assim nascia o Assentamento Tapera.
“Aí foi que melhorou, vários projetos vieram para cá”, conta Antônio orgulhoso da história de luta e persistência da comunidade. Ele diz que considera as pessoas que lutaram pela conquista da terra na Tapera verdadeiros heróis e comemora por nenhuma vida ter sido perdida nessa luta: “Feliz é aquele herói que vê o final da luta vivo”.
Hoje, o Assentamento Tapera é composto por 43 lotes para moradia das famílias, 9 lotes comunitários e 2 áreas de reserva. O assentamento faz parte de diversos projetos de desenvolvimento sustentável rural, incluindo a construção de tecnologias sociais para a convivência com o semiárido. Entre eles, a Tapera integra o Programa Sementes do Semiárido, da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA Brasil).
O programa apoia Casas de Sementes comunitárias como estratégia de resgate e valorização do patrimônio genético. Na dinâmica das comunidades no Semiárido, as famílias agricultoras selecionam as melhores sementes e as guardam para os próximos plantios. Dessa forma, as Casas de Sementes são espaços de riqueza alimentar, capaz de assegurar a segurança e soberania alimentar e nutricional das populações do Semiárido.
Para a agricultora e membro da associação comunitária da Tapera, Elisângela Aquino, mais conhecida como Lô, a Casa de Sementes é a representatividade da comunidade, “um lugar onde quem vier nos visitar pode conhecer e levar de tudo que nós produzimos”. Lô explica que foi acordado com a comunidade que quem levar uma quantidade de sementes deve devolver o dobro na próxima safra, assim a Casa sempre terá sementes para disponibilizar para os agricultores.
Ela avalia que um dos maiores desafios do programa é fazer com que as famílias levem as sementes, que estão armazenadas em suas casas, para o espaço comunitário da Casa de Sementes. Para a agricultora a semente crioula é resistência e vida. “A semente tem que gerar!”, conclui.
Postado por:
Comunicação ASA Minas
Editado por:
Comunicação ASA Minas